quinta-feira, 19 de junho de 2008

Oração aos Moços



Oração aos moços.
Rui Barbosa.
Ano 1922.


Resenha

Quem sabe-sabe e pronto, pois Até uma simples carta - que no caso de um gênio deixa de ser simples - entra para a historia da literatura de nosso Brasil. Tudo começou com um simples convite da turma de formandos do curso de Direito da USP, ao Advogado, Jornalista, jurista, político, diplomata, ensaísta e orador Rui Barbosa. Nascido na capital do estado da Bahia, Salvador, em 5 de novembro de 1849, e faleceu (apenas o corpo) em Petrópolis, RJ, em 1º de março de 1923. Membro fundador da Academia Brasileira de Letras, que tem sua sede na cidade do Rio de Janeiro.

É impressionante a capacidade que este brasileiro tem de raciocinar sobre eventos, ou momentos que aparentemente não tem assim por dizer tão grande importância, ao iniciar a leitura deste livro, já logo no inicio percebe-se claramente que ali não consta apenas uma simples oração, pois a profundidade inicial desta carta mostra-nos claramente que para esse cidadão o evento sobre o qual ele esta escrevendo tem uma importância não só para eles(alunos) mas principalmente para o Brasil.

Ao ler e meditar na profundeza que expõe a esta carta mostra quão admirável é este homem oração aos moços não é uma oração religiosa, mas é como se fosse uma súplica extremamente bem planejada, bem pensada com meses de antecedência, mas não é nada disso, pois se assim fosse seria apenas os “frutos do trabalho” e por não ser torna o autor da carta um personagem ainda mais brilhante.

Ele começa expressando sua esperança naqueles moços, de continuar o trabalho que ele estava de sua parte prestes a terminar.
Como sempre acontece com um “grande” brasileiro é perfeitamente possível detectar em suas palavras um tom de despedida, chega a ser emocionante a sua explicação quanto ao fato de não ser possível estar pessoalmente no evento, colocando a responsabilidade em Deus, e considerando o oficio de advogado como um sacerdócio.
“Não quis Deus que os meus cinqüenta anos de consagração ao direito viessem receber no templo do seu ensino em São Paulo o selo de uma grande bênção, associando-se hoje com a vossa admissão ao nosso sacerdócio, na solenidade imponente dos votos em que o ides esposar.”
Rui Barbosa expressa de maneira extremamente humilde toda a sua sabedoria, experiência, o amadurecimento que adquiriu ao longo de sua vida. Vale lembrar que ele mesmo convalescendo não esquece dos miseráveis daquela época.

Como essa carta continua atual, poderia ter sido escrita hoje. O carinho para com o povo brasileiro foi outra face de Rui Barbosa sempre se preocupou com os menos favorecidos, sonhava ele uma vida digna para todo o povo brasileiro, talvez tenha aprendido sobre miséria em seus dias de mocidade na Bahia.

Mas apesar de todo o seu descontentamento com a situação social da camada esquecida da sociedade, ele deixa bem claro que não, este convite não o encontra com o “gosto amargo” do fel na boca, pelo contrario sentiu-se extremamente honrado com tal convite.

Faz uma comparação brilhante entre o bem e o mal usando da pessoa de Jesus Cristo com todo respeito reconhecendo ser este o filho de Deus, amoroso, receptivo porem em estado de homem também irava. Tudo isso para justificar um possível descontentamento com a situação do povo brasileiro, abandonado por seus governantes, que sempre se fizeram de cegos para não ver a triste realidade social daquela época, mas ao perceber isso faz um esforço para retomar a direção do assunto em questão.

Assim que a bênção do paraninfo não traz fel. Não lhe encontrareis no fundo nem rancor, nem azedume, nem despeito. Os maus só lhe inspiram tristeza e piedade. Só o mal é o que o inflama em ódio. Porque o ódio ao mal é amor do bem, e a ira contra o mal, entusiasmo divino. Vede Jesus despejando os vendilhões do tempo, ou Jesus provando a esponja amarga no Gólgota. Não são o mesmo Cristo, esse ensangüentado Jesus do Calvário e aqueloutro, o Jesus iroso, o Jesus armado, o Jesus do látego inexorável? Não serão um só Jesus, o que morre pelos bons, e o que açoita os maus?
À medida que o nobre jurista vai escrevendo a carta, ele vai cada vez mais se aprofundando na conjuntura, político-social daquela época. Sabendo que já não tinha muito mais tempo de vida, Rui Barbosa aproveita a oportunidade para deixar bem claro aos moços, que ele não tinha perdido a esperança, de termos um país aonde à eqüidade venha a prevalecer.

Ao contrario de muitos que, naquela altura da vida, com uma grande quantidade de decepção por deglutir, não quer mais lutar, e só pensa em viver seus últimos dias de pijama, se corroendo de dor e tristeza, por ter lutado a vida toda, sem ter alcançado seus objetivos. Ele não perde a oportunidade de ir fundo, mas bem fundo, nas consciências daqueles bacharéis. É como se ele estivesse emitindo um grito de socorro bem alto, que alias ate hoje ecoa em nossos ouvidos, um pedido de socorro não para si mesmo, mas para toda a sociedade brasileira, principalmente para os mais humildes, e necessitados.

Outro fato que chama-nos atenção é o nível de espiritualidade do Dr. Rui Barbosa, seus livros sempre fazem menção, as personalidades celestiais. Deus está sempre presente nas palavras do nobre jurista. Tal virtude, com certeza, foi decisiva para que em toda sua vida, o equilíbrio e a convicção de seus pontos de vistas, tivessem coerência, clareza e objetividade. Como esta carta, em que ele sem pestanejar, transformou-a em uma oração.

“Então, não somente não peca o que se irar, mas pecará não se irando. Cólera será; mas cólera da mansuetude, cólera da justiça, cólera que reflete a de Deus, face também celeste do amor, da misericórdia e da santidade.”
“Dela esfuzilam centelhas, em que se abrasa, por vezes, o apóstolo, o sacerdote, o pai, o amigo, o orador, o magistrado...”

Nessa carta o escritor se expõe de maneira clara e categórica. É como se ele estivesse aproveitando a oportunidade de desabafar, e por ser por este intermédio, não se contem e abre o ‘coração’ extrapolando seus sentimentos. De todos os níveis, em todas as áreas de sua vida. Talvez querendo explicar que, há muito, senão tudo, por fazer e ele, sabe que esta vivendo a sua despedida nesta vida. Mostra grande desejo, muito grande de conseguir passar para aqueles jovens bacharéis, o peso, a responsabilidade e a honra de se dedicar a nossa pátria, peso esse que ele sente que esta, também sobre seus “ombros”. Veja um trecho que nos mostra isso, se havia duvida, agora esta já não se faz presente, pois ele compara sua vida com um livro, e não um livro fechado, mas escancarado, totalmente aberto. Veja:

“Estou-vos abrindo o livro da minha vida. Se me não quiserdes aceitar como expressão fiel da realidade esta versão rigorosa de uma das suas páginas, com que mais me consolo, recebei-a, ao menos, como ato de fé, ou como conselho de pai a filhos, quando não como o testamento de uma carreira, que poderá ter discrepado, muitas vezes, do bem, mas sempre o evangelizou com entusiasmo, o procurou com fervor, e o adorou com sinceridade.”
Neste balanço de sua atuação como advogado, jornalista, político, cidadão combativo e como representante do Brasil na Conferência de Haia, na Holanda. Rui Barbosa responde a consulta de Evaristo de Morais, que queria saber qual é o Dever do Advogado; e cuja resposta que emitiu se iguala-la a um tratado de ética profissional.

Essa: Oração aos Moços, que apesar de pequena em suas dimensões, constitui uma obra prima, um verdadeiro clássico da literatura brasileira e no que diz respeito à ética profissional. Grande herança acadêmica que o preocupado Rui Barbosa, deixa às gerações futuras.

Rui Barbosa, também dedica boa parte dessa carta, para alertar os formandos, das características de cada ser. Lembra o notável, não há nada igual nesse mundo. Cada elemento tem suas próprias características. Propriedades exclusivas de cada um, e o Advogado precisa respeitar tal fato, sob pena de não conseguir defender os interesses de seus clientes, deixando assim uma sensação de desamparo. Perceber tais singularidades é de extrema importância, pois como se sabe, o que é bom e agradável para uns, não são para outros. É nessas particularidades, que consiste deixar a agradável aparência de satisfação.
“A parte da natureza varia ao infinito. Não há, no universo, duas coisas iguais. Muitas se parecem umas às outras. Mas todas entre si diversificam. Os ramos de uma só árvore, as folhas da mesma planta, os traços da polpa de um dedo humano, as gotas do mesmo fluido, os argueiros do mesmo pó, as raias do espectro de um só raio solar ou estelar. Tudo assim, desde os astros, no céu, até os micróbios no sangue, desde as nebulosas no espaço, até aos aljôfares do rocio na relva dos prados”.
O nobre jurista não perde a oportunidade, de deixar uma palavra de animo, recomendando que sejam perseverantes, ante os desafios, que eles com certeza iriam encontrar, em suas jornadas. Com certeza o Dr. Rui Barbosa, falava de si próprio, de seus inúmeros obstáculos, das enormes dificuldades que ele com certamente enfrentou. Entretanto a modéstia não deixou que ele citasse a si próprio como exemplo, passando essa honra a outra pessoa. Ninguém chega aonde ele chegou, sem lagrimas, muitas lagrimas, “mãos calejadas” da batalha. Esse brasileiro pode descasar em paz, com a consciência tranqüila, pois dedicou toda sua vida, a cultura brasileira.

“Já vedes que ao trabalho nada é impossível. Dele não há extremos, que não sejam de esperar. Com ele nada pode haver, de que desesperar.”
Na ocasião em escreveu essa carta, ele já estava com a saúde debilitada e já próximo de sua morte, o Dr. Rui Barbosa ensinou, sobretudo como efetuar com perfeição qualquer incumbência assumida. Exortou que ninguém deve começar uma jornada sem estar em condições de executa-la, com o mínimo de profissionalismo, dedicação integral e amor. Sábios conselhos de humildade, mansidão, temperança e dedicação a cada tarefa assumida com a sociedade. Nesse mesma carta ele atribui, que o seu notável saber intelectual as madrugadas em passou em claro estudando com tenacidade e dedicação, um sinal de alerta para todos que milita nessa vida, sem esforço não se consegue absolutamente nada digno de ser inesquecível.
“Há estudar, e estudar. Há trabalhar, e trabalhar. Desde que o mundo é mundo, se vem dizendo que o homem nasce para o trabalho: “Homo nascitur ad laborem”. Mas o trabalhar é como o semear, onde tudo vai muito das sazões, dos dias e das horas. O cérebro, cansado e seco do laborar diurno, não acolhe bem a semente: não a recebe fresco e de bom grado, como a terra orvalhada. Nem a colheita acode tão suave às mãos do lavrador, quando o torrão já lhe não está sorrindo entre o sereno da noite e os alvores do dia”.
Só assim Oração aos Moços, terá alcançado êxito em seus objetivos. Pois o que ele deixa para todos os acadêmicos, é que o destino de nossa nação esta em nossas mãos; no amanhã seremos os governantes de hoje, seremos os legisladores de hoje. Chama ele atenção para o fato que, o destino da nação é responsabilidade de todos nós.

Ninguém pode escusar-se, como se não tivéssemos nada com isso. O nobre Advogado, não se cansa de chamar a atenção, para a importância de se ter mais interesse pelo destino do país. Um balanço dos seus cinqüenta anos de dedicação, a Advocacia, ao Jornalismo, a Política, como Jurista e como cidadão combatente, podem ser apreciado, de maneira biográfica. Mostrando o quanto ele tinha interesse pelos diversos assuntos, que delineiam o rumo que o país pode tomar. Quis ele ajudar que esse rumo fosse o melhor para toda a nação.
Quis ele que nenhum seguimento da nossa nação fosse excluída, do básico para uma vida digna, das famílias brasileiras, com uma preocupação principalmente pelas famílias menos favorecidas, e também muitas preocupação demonstra ele pelos que estão classificados como miseráveis.
Uma maneira impressionante, de se fazer isso é ir diretamente onde estava se formando o futuro das instituições de nosso país.
Essa carta mostra que, mesmo em uma ocasião tão festiva, a espaço para se cuidar de quem, passaria a lidar diretamente, com a coletividade e suas necessidades. Tais bacharéis viriam, possivelmente a serem políticos legisladores do destino de nosso país, e o nobre Jurista não perdeu oportunidade de “plantar” a preciosa semente naqueles corações férteis, e mentes abertas. Tentou ele fazer a parte dele até o fim, esperando que sua esperança naqueles bacharéis não fosse em vão, pois caso contrario, tal responsabilidade teria que ser, ou, continuar a ser assumida por quem menos tem condições de assumir.



“Encarai, jovens colegas meus, nessas duas estradas, que se vos patenteiam. Tomai a que vos indicarem vossos pressentimentos, gostos e explorações, no campo dessas nobres disciplinas, com que lida a ciência das leis e a distribuição da justiça. Abraçai a que vos sentirdes indicada pelo conhecimento de vós mesmos. Mas não primeiro que hajais buscado na experiência de outrem um pouco da que vos é mister, e que ainda não tendes, para eleger a melhor derrota, entre as duas que se oferecem à carta de idoneidade, hoje obtida.”
Para tentar alcançar algum êxito nesse intento, o nobre faz um apelo veemente, para que os bacharéis lhes dessem ouvidos. Ele chaga a se colocar no lugar paternal, para demonstrar-lhes a tamanha importância de levar a serio o nosso o vosso oficio, que a partir de então começariam a desempenhar, e tal oficio é para toda a vida, e lembra: Todo pai é conselheiro natural. Todos os pais aconselham, se bem que nem todos possam jurar pelo valor dos seus conselhos. Os meus serão os a que me julgo obrigado, na situação em que momentaneamente estou, pelo vosso arbítrio, de pai espiritual dos meus afilhados em letras, nesta solenidade.
Conclusão

Apontado por unanimidade no meio acadêmico como um texto clássico da cultura brasileira, Oração aos Moços voltou às livrarias em nova edição. Prefaciado pelo jurista, professor e ex-ministro da Justiça, Dr. Miguel Real Júnior. O livro recoloca em discussão aquele que é apontado por todos como o legado de Rui Barbosa às novas gerações.

Com a saúde debilitada, Dr. Rui Barbosa aproveitou o convite para ser paraninfo dos formandos da turma de 1920 da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e fez um balanço de suas atividades como advogado, jornalista e ativo participante na vida pública brasileira: combateu a escravidão, lutou pelo fim da Monarquia e a proclamação da República, foi quatros vezes candidato derrotado à Presidência, e representou o Brasil na célebre Conferência de Haia, na Holanda.

Impedido pelos médicos de comparecer à cerimônia nas Arcadas, escolheu, então, o professor Reinaldo Porchat para ler o discurso, cuja leitura foi interrompida inúmera vezes pelos aplausos entusiasmados dos estudantes. Era a consagração de Oração aos Moços, uma obra que até hoje tem gerado inúmeros estudos.

Sua importância está ressaltada no prefácio de Miguel Reale Júnior: “A palavra dos homens de inteligência e dedicados a causas de interesse de todos e da Nação jamais deixa de ser atual. Mas, no caso da “Oração aos Moços”, a sua atualidade chega a ser surpreendente, tornando-se obrigatório ao moço de hoje, da sociedade eletrônica, da internet, meditar sobre os conselhos que brotam seguidamente do texto”.

Discutindo valores, posturas, princípios, Oração aos Moços torna-se ainda mais atual quando aborda a ética e conclama pela justa aplicação da lei: ”... o direito dos mais miseráveis dos homens, o direito do mendigo, do escravo, do criminoso, não é menos sagrado, perante a justiça, que o do mais alto dos poderes. Antes, com os mais miseráveis é que a justiça deve ser mais atenta”.

Aspectos Jurídicos:

A constituição de 1988 garante a todos os brasileiros, um salário mínimo que garante aos cidadãos: moradia, saúde, escola, segurança, alimentação e lazer. Isso porem só acontece na teoria, pois na pratica não é nada disso que ocorre.
Já na época da escrita desta carta, o escritor mencionava a necessidade de se cuidar dos menos favorecidos. Essa incumbência esta cada vez mais nas mãos das novas gerações, pois esse Direito não tem sido respeitado pelo Estado. Nem tão pouco o sistema jurídico brasileiro tem se mostrado capaz de fazer nossa carta magna, funcionar nesse sentido.

Um comentário:

Maah .. Daneks disse...

Muito bom, parabens.

Aborda de forma exata o que Rui Barbosa tentou nos transmitir !